Folha de S. Paulo, sexta-feira, 27 de junho de 2008
Cláudia Collucci
Um casal de Timóteo (216 km de Belo Horizonte) luta na Justiça pelo direito de ensinar seus filhos em casa. Adeptos do homeschooling (ensino domiciliar), movimento que reúne 1 milhão de adeptos só nos EUA, eles tiraram os filhos da escola há dois anos, o que é proibido pela legislação brasileira. Eles atribuem a decisão à má qualidade do ensino do país.
Cléber e Bernadeth Nunes respondem a processos nas áreas cível e criminal — se condenados, podem perder a guarda dos filhos. Ontem, na audiência do processo criminal movido contra eles, por abandono intelectual, o juiz Ronaldo Batista ouviu Davi, 15, e Jônatas, 14, que garantiram não terem sido obrigados pelos pais a deixarem a escola.
O próximo passo determinado pelo juiz será uma avaliação sócio-educacional dos meninos feita por peritos. Também foram arroladas duas testemunhas de defesa do casal. Ainda não há uma data prevista para a próxima audiência.
Cléber e Bernadeth respondem também a uma ação cível por infringir o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), que já resultou em uma condenação: pagamento de multa de 12 salários mínimos e obrigação de rematricular os filhos. O casal recorreu da decisão.
“É um absurdo. Estão tratando a gente da mesma forma que tratam os pais que negligenciam a educação dos filhos, que os retiram da escola para pedir esmola nos sinais”, diz Nunes, 44, designer gráfico autodidata, que abandonou os estudos formais no primeiro ano do ensino médio. A mulher é decoradora e cursou até o segundo ano da faculdade de arquitetura.
Para demostrar que o ensino em casa é eficiente, Cléber Nunes diz ter incentivado os filhos a prestar o vestibular na Fadipa (Faculdade de Direito de Ipatinga), escola particular da região, no início do ano. Eles foram aprovados em 7º e 13º lugar. O resultado virou peça de defesa no processo.
“Meus filhos estão muito mais adiantados nos estudos do que se estivessem na escola”, garante o pai. Segundo ele, a rotina escolar doméstica começa às 7h com a leitura da bíblia. “Não temos uma religião definida. Não somos nem católicos, nem evangélicos.”
Nos EUA, o homeschooling é praticado por grupos religiosos.
Os meninos aprendem retórica, dialética e gramática, aritmética, geometria, astronomia, música e duas línguas estrangeiras — inglês e hebraico. Ao todo, estudam em média seis horas por dia.
“Podemos fazer muito mais por eles do que o ensino que estavam recebendo na escola pública. Todo mundo sabe que a escola brasileira vive uma deficiência crônica”, afirma Nunes.
O Ministério Público diz que o casal violou princípios constitucionais e contrariou o Código Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que exigem matrícula no ensino formal.
Os Nunes foram denunciados ao Conselho Tutelar em 2007 por um morador da cidade. “Vamos lutar até as últimas conseqüências pelo direito de educar nossos filhos”, diz Nunes, que tem uma filha de 1 ano.
O homeschooling é regulamentado em países como Canadá, Inglaterra, México e alguns Estados dos EUA. Ao todo, 2 milhões de crianças seguem esse sistema de ensino, segundo a Unesco.
Educadores afirmam que a função da escola vai muito além do ensino e que o convívio escolar tem um papel importantíssimo na vida da criança e do adolescente.
Justiça vetou pais de ensinar filhos em 2001
O caso da família Nunes não é o primeiro que chega à Justiça brasileira. Em 2001, o casal Carlos e Márcia Vilhena Coelho impetrou um mandado de segurança para garantir o direito de ensinar em casa três filhos com idades entre seis e nove anos.
As crianças, apesar de formalmente matriculadas no Colégio Imaculada Conceição, de Anápolis (GO), nunca haviam freqüentado regularmente a escola. Estudavam em casa e só iam ao colégio para a entrega de trabalhos ou para fazer provas.
Na época, os Vilhenas receberam manifestações de apoio de vários países onde o homeschooling é regulamentado. Agora, Márcia Vilhena e seu filho mais velho serão testemunhas de defesa dos Nunes.
No início deste mês, o deputados federais Miguel Martini (PHS-MG) e Henrique Afonso (PT-AC), protocolaram projeto de lei na Câmara que regulamenta a educação domiciliar no país.
2 comentários:
Sou professor há 25 anos, eduquei as crianças em casa , precisamente num sítio com outras famílias… como foi gratificante.Tinhamos aulas de campo, meio ambiente em trilhas de mata,Ciências na Horta, aliadas a Geometria, Matemática,literatura,relevos dos mapas de Geografia em argila, tudo bem diferente do que está na moda do Inter e transdisciplinar, mas, mas dentro do real do trans e interdisciplinar.A criançada tinha clube nos lagos dos sítios, andavam à cavalo, bicicleta, tinham perfeita interação com os vizinhos , tinham aulas de Teatro, com direito até algumas explosões em aulas da Química do dia-a-dia: do sabão, sabonete, medicina natural,( não me recordo de terem tomado antibiótico e antiinflamatório),shampoo,detergente,adubação orgânica, compostagem etc… Hoje tenho duas filhas terminando faculdade e um casal irá entrar no ano que vem. Não vejo o motivo da tirania do governo em querer retirar a liberdade dos Pais de darem o ensino em casa, se nos PCNs pregam quase como Doutrina o direito à pluralidade cultural , respeitar os diferentes etc. Daqui uns dias iremos necessitar de Lei complemetar contra a FAMILHOFOBIA.
Tenho 50 anos, e na fazenda de meu pai tinha uma escola funcionando num paiol com mesma ou melhor qualidade que as de hoje … Aqui em Goiás estudando a História do cerrado goiano vemos que vários pais contratavam um professor para ministrar a Linguagem e a Matemática básica. Tudo era feito em alguns meses e a ”coisa funcionava” sem a parafernália da multidão de projetos.A economia do nosso método era imensa, longe do consumismo e dos descartáveis, a lista de compra no início do ano não passava de uns 20 Reais por criança. Hoje é muito comum um jovem terminar o 9° ano analfabeto funcional. Dificilmente um magistrado um Governante irá colocar seus filhos na escola Pública, pois sabem muito bem em classificação ela está em relação aos outros países, sem falar no descaso que a Escola se encontra, mas em contra partida quando ouvimos um discurso de prefeito secretário municipal ou outra autoridade , temos a impressão que estamos entre os primeiros do mundo ! É comum, só não divulgado, mandarem jovens com comportamento destrutivo, consumidores de drogas, até assassino,assistirem aulas junto com crianças na faixa etária de 10 e 13 anos.Não sou contra promover os seres humanos, não sou contra a inclusão , mas tudo isso está sendo feito “para inglês ver”, sem critérios nem estudos de impacto social.
Agora tenho um grande dilema, o que meus netos irão encontrar na escola pública daqui uns 6 anos ? Teremos uma escola que respeite nossas tradições e nossa fé católica?
Concordo em gênero, número e grau com o Prof. Wantuildes, pois gostaria que tivéssemos mais liberdade nessa questão. Minha esposa é professora e meus filhos, apesar de estarem matriculados em escola, aprendem mais em casa com ela do que na escola, e ainda com todos os riscos pseudo-laicos e tendenciosos do ensino regular a que são expostos diariamente, que precisam de correção constante.
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